sábado, 19 de novembro de 2011

Flora visional


Estar entre os pares como em disparate, emaparedada, de frente para o perigo mais que iminente- se é com e ou com i um tanto incerto se parece, pouco importa, o perigo está sempre no alto – no entanto sei que de longe a gente sempre direito, de perto a visão embaça, a vista traça o encosto, o enrosco, o gesto e há quem se perca em vertigens alucinatórias torturantes ataduras coruscantes ou vinhos rascantes. Nãobandeids de calcanhar no dois pra dois pra . Visão muito nítida entorta-me a veia cava do meu peito: singular para prevenir o estresse; singulair para prevenir a falta de ar; sing with us para prevenir a gagueira. Na farmácia de tudo um pouco se encontra para quem pouco quer- parece-me pouco suficientemas é demais, como um louco devaneio senil hostil febril ou azul anil. As rimas nunca foram necessárias  mas elas vêm assim mesmo, permito-me ser in-vadia-dida pernóstica visão esta minha que doura a pílula úmida na ponta da língua marca o dia da semana certo e o fura com a unha procurando evitar a vida que não chama, simplesmente vem eu disse que não queria ver tanto mas vejo e daí? A sorte mente, dá uma de Deus procurando resolver o que nem é da sua conta, mostra o que nem pedi para ver mas falta remoto controle desta imagem que se projeta no cristalino das idéias turvas. Mente. Muito mais quando os vultos, os embaçamentos da flora visional eram o foco. a sombra do lustre tilintando alimentava meu parco porco circo dos horrores. Tarde. não me adianta mais tirar os óculos.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

No segundo seguinte tem mais...


Eles se conheceram há mais de trinta anos atrás quando ela disse oi e ele também disse. Pensou que era apenas confusão com outra pessoa, mas o caso é que ele era do tipo que conversa com todo mundo, fila de banco, de ponto de ônibus e de pão eram as preferidas para começar um papo, inventar umas mentirinhas sobre uma vida fenomenal que nunca levou e tal. Tudo de boa intenção, afinal, poderia nunca mais ver aquele indivíduo à sua frente, e imaginação gigante era o seu forte. ela sempre sonhou em perder o medo das pessoas e pensava um dia entrar no metrô e perguntar para a moça bem arrumada qual o creme de cabelo que ela usa, ou comentar que absurdo era a segurança neste país, e os políticos? é uma vergonha o que passou hoje na tevê... Mas como sempre teve medo, achava sempre melhor colocar os fones de ouvido, ler uma revista ou ficar ouvindo conversa alheia desviando o olhar quando percebida. Depois desse oi, no entanto, ela mudou um pouco e passou a puxar conversa com velhinhas e sorrir para crianças, mas ainda não encara nem senta ao lado de homens mais velhos. Ele também mudou, algumas vezes prefere passar a viagem olhando pro rosto dela com olhar de peixe morto, falando no seu ouvido ou lamentando os erros de ontem e hoje. Nenhum dos dois sabe ao certo se mudaram pra melhor ou pior desde àquele dia, se gastaram as horas pensando demais ou se foram muito longe quando entraram na vida um do outro. sabem que foi assim. No segundo seguinte tem mais...

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Vinte anos depois


Desde aquele dia nunca mais nos vimos. Foi estranho ele aparecer assim, no meio do nada. Vinte anos depois ele não ganhou barriga, não agrisalhou os cabelos nem mudou a maneira de vestir. O jeitinho de surfista mostrava a total impossibilidade de procurar alguém como eu, mas o acontecido de duas décadas atrás também parecia improvável. Conversamos sobre o tal professor de teatro sádico que me pôs na parede naquela ocasião. Engraçado você ter me defendido, falei. Ele não achou engraçado, e sim necessário. Eu sempre fiquei na minha tribo, e você parecia um candidato a atorzinho da Globo. Mas não estávamos no Tablado, ele disse. Eu concordei. Talvez não tivéssemos que assistir a três horas daquela bendita entrevista egocêntrica. Ele riu. Ele ria muito bonito, assim como há vinte anos. Eu estranhei as minhas rugas, barriga e cabelos soltos, a súbita e recente vaidade, a coragem... e percebi que ele estava ali de passagem. No entanto, eu não era apenas mais uma pra ele, eu existia realmente. ELE era mais um pra mim. E se desfez, assim, na minha frente. Em poucos instantes era apenas um monte de branco amontoado na mureta onde antes sentava. Soprei.

segunda-feira, 7 de março de 2011

A lua de Ísis

Não foi a primeira vez que você me pediu a lua. Da primeira vez eu achei inebriantemente fascinante este teu desejo incontestável, teu amor platônico por uma falsa estrela. Explica o teu incômodo com a luz do sol? Talvez. A figura mítica da falsa estrela que não tem luz própria me invadiu e eu pude dizer: “Não dá, filha, tá muito longe...muito longe...” e continuei subindo as escadas te conduzindo pela mão. No entanto, pouco posso te guiar nas agruras do sonho. A lua nos seguiu –de novo- no caminho até em casa, repetindo o trajeto da primeira ocasião, que muito mais cheia, mais reluzente, ficou mais tempo enredada à janela do carro e desta vez você chorou, filha, um choro doído, de coração machucado mesmo quando ela se escondeu atrás de um prédio alto. “Somiu...”  Eu quis ficar triste, mas não pude, o desejo do impossível sempre foi o meu fraco. Quis pegar teclado, caneta ou lápis preto para desandar esta massa onírica de palavra e tatuar seu primeiro pedido epifânico: “Mamãe, eu quero a lua! É minha!” Não senti ter de dizer que está muito longe porque -como eu disse- os amores platônicos, as veredas espinhosas, os desertos intermináveis, o desejo do impossível sempre foi o meu fraco. E agora, filha, estamos mais perto do que nunca...

Amar os créditos

Sou do tempo em que a gente podia ficar no cinema para assistir o início do filme que se perdeu porque chegou atrasado. Nesse meio tempo, havia o esplendor do intervalo e podíamos aproveitar o momento dos créditos para namorar, comprar mais pipoca, ou apenas para prolongar aquela sensação boa(ou não) que o filme deixou na gente. A música ajuda a manter o clima e dá um tempo pra que se pense sobre o que vimos na tela. Como boa filha de cinéfilo (chegamos a ver ET, o extraterrestre seis vezes na tela grande) sempre amei este momento. A TV aberta considera perda de tempo, mas o DVD e a TV paga me mostraram que eu ainda podia ficar mais tempo abraçadinha ao final de um romance, manter o sorriso nas comédias, esticar as lágrimas nas histórias dramáticas ou reforçar as perguntas nos filmes alternativos. Meu marido, no entanto, nunca entendeu, desligava rapidamente o aparelho ao primeiro sinal de fim. Em nossas primeiras sessões juntos (quando ainda nos era permitido ficar) ele levantava correndo, escravo da pressa que nos levaria ao outro lado da rua. Hoje em dia, as crianças mostram a ele como este momento pode ser desfrutado. Elas aproveitam para dançar balé. Na tela nãoquase nada para se ver, as letras miúdas subindo no negrume, mas a música...a música tem o poder de nos fazer reviver a trama... Proponho um movimento a favor do depois, tanto no amor quanto no cinema. Os capitalistas nos tiraram o direito de amar os créditos. Findo o filme, um exército de funcionários uniformizados e adestrados nos expulsa do recinto. Depois de fazer amor é bom ficar abraçado, conversar, olhar no olho, dizer eu te amo e, talvez, começar de novo... Ouquem prefira sair correndo com as calças na mão?