segunda-feira, 7 de março de 2011

A lua de Ísis

Não foi a primeira vez que você me pediu a lua. Da primeira vez eu achei inebriantemente fascinante este teu desejo incontestável, teu amor platônico por uma falsa estrela. Explica o teu incômodo com a luz do sol? Talvez. A figura mítica da falsa estrela que não tem luz própria me invadiu e eu pude dizer: “Não dá, filha, tá muito longe...muito longe...” e continuei subindo as escadas te conduzindo pela mão. No entanto, pouco posso te guiar nas agruras do sonho. A lua nos seguiu –de novo- no caminho até em casa, repetindo o trajeto da primeira ocasião, que muito mais cheia, mais reluzente, ficou mais tempo enredada à janela do carro e desta vez você chorou, filha, um choro doído, de coração machucado mesmo quando ela se escondeu atrás de um prédio alto. “Somiu...”  Eu quis ficar triste, mas não pude, o desejo do impossível sempre foi o meu fraco. Quis pegar teclado, caneta ou lápis preto para desandar esta massa onírica de palavra e tatuar seu primeiro pedido epifânico: “Mamãe, eu quero a lua! É minha!” Não senti ter de dizer que está muito longe porque -como eu disse- os amores platônicos, as veredas espinhosas, os desertos intermináveis, o desejo do impossível sempre foi o meu fraco. E agora, filha, estamos mais perto do que nunca...

Amar os créditos

Sou do tempo em que a gente podia ficar no cinema para assistir o início do filme que se perdeu porque chegou atrasado. Nesse meio tempo, havia o esplendor do intervalo e podíamos aproveitar o momento dos créditos para namorar, comprar mais pipoca, ou apenas para prolongar aquela sensação boa(ou não) que o filme deixou na gente. A música ajuda a manter o clima e dá um tempo pra que se pense sobre o que vimos na tela. Como boa filha de cinéfilo (chegamos a ver ET, o extraterrestre seis vezes na tela grande) sempre amei este momento. A TV aberta considera perda de tempo, mas o DVD e a TV paga me mostraram que eu ainda podia ficar mais tempo abraçadinha ao final de um romance, manter o sorriso nas comédias, esticar as lágrimas nas histórias dramáticas ou reforçar as perguntas nos filmes alternativos. Meu marido, no entanto, nunca entendeu, desligava rapidamente o aparelho ao primeiro sinal de fim. Em nossas primeiras sessões juntos (quando ainda nos era permitido ficar) ele levantava correndo, escravo da pressa que nos levaria ao outro lado da rua. Hoje em dia, as crianças mostram a ele como este momento pode ser desfrutado. Elas aproveitam para dançar balé. Na tela nãoquase nada para se ver, as letras miúdas subindo no negrume, mas a música...a música tem o poder de nos fazer reviver a trama... Proponho um movimento a favor do depois, tanto no amor quanto no cinema. Os capitalistas nos tiraram o direito de amar os créditos. Findo o filme, um exército de funcionários uniformizados e adestrados nos expulsa do recinto. Depois de fazer amor é bom ficar abraçado, conversar, olhar no olho, dizer eu te amo e, talvez, começar de novo... Ouquem prefira sair correndo com as calças na mão?