sábado, 4 de janeiro de 2014

AMANDAS

Ela tinha suas esquisitices. Boca nua, lábios crus e palavra gasta. Nunca soube quem gostasse. Embora a moda fosse bolo sem confeitar a pedra esculpida sempre levara mais jeito. E a carcaça sempre cheirou mal ao contrário da carne viva. Ela sempre foi assim. Mas como as temperaturas sobem a cinquenta, os ânimos também avalancam-se entre as ancas de quem te pariu mas hoje nem sabe por onde andas. Amandas. Era uma e súbitas muitas que acotovelavam-se na cútis molenga e desvairada como sempre fora. Mas os planos de celular sempre cobrem todos os serviços e agora não há quem leve susto na conta mas ela leva mesmo assim para que não perca o costume de acostumar-se com algo assim que parece fugidio (por que sempre escrevo esta palavra?) mas na verdade já foi, jogou o chip fora, mudou de número, de operadora e esqueceu completamente de propósito que existia portabilidade. Deve ser porque Amandas sempre odiou tecnologia, pois por causa dela tinha de abandonar seu walkman, desfazer-se de seu carro que já era da família (tinha até apelido) e sacrificar seu cachorro porque estava doente e este mundo não suporta os doentes, gordos, feios, esquisitos, os não- consumistas, os não-felizes do facebook ... Este mundo não suporta gente, a de verdade. Esquisitices à parte, amands ( assim mesmo, minusculizada e abreviada) escreve cartas à mão, não ouve mais o Jorge, parou com a dieta da proteína, ainda teima em telefonar para os amigos no dia do aniversário, lembra de cor o número da mãe, sonha com paninhos de crochê na mesinha de centro (passou a odiar a moda clean) coleciona jornal velho com matéria re-lida e tem medo de dormir sozinha no escuro. Ali-menta-da, ela morre de fome.

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