quarta-feira, 11 de junho de 2014

INFINITIVO PLURAL

Deitar-te no meu colo como se fosse a última coisa possível, provável, imaginável. Chegar-te tão perto como se o longe parasse e rígido ficasse, dissolvido na névoa branca do tempo. Descrever-te como quem, cego, precisa do guiar do som e do tato.   Cantar-te como se as mais finas penugens em notas se transfigurassem na dura pena  da proximidade da morte. Enluarar-te como quem sopra frio vento e, ao relento, finge que não vê o sol levantar. Vestir-te de nudez a cada palmo, cobrindo a bruma com a ponta do lençol. Caber-te na casa lenta do botão despregado de sutiãs e seios. Suar-te como a água doce que, descendo do corpo, corre na despertança da manhã. Pentear-te de fio a pavio, de onda, sem pressa, sem rua, sem qualquer abrir de janelas, tal qual Bentinho e Capitu. Calar-te a dedos enredantes, sisudo mas quente como brasa ofuscarada. Nortear-te a rosas brisas e enleios, sem rumo ou traço de areia, seco e leve. Medir-te completo e exato, derretendo a régua reta da planta do pé. E, por fim, despir-te em veste de pele, completando a letra que falta com palavra: cheio, meio a meio, metade meu, metade teu, sem denominador comum. Apossar-te de mim, tomando à força a fração (justa) que me cabe.